Legado


Passados tantos e tantos tempos, o homem começava a ficar intrigado com aquilo. A cada pensamento que dedicava à sua amada, uma borboleta surgia para visitá-lo. Não podia ser coincidência. Fazia muito tempo que acontecia, embora só agora ele atentasse para o fato.

Num dia distante do passado, o homem perdera a mulher de sua vida – para sempre é que a perdia. Até hoje não conseguia entender como foi que deixou-se enveredar por trilhas a tal ponto tortuosas que o impediram de agir a tempo – de evitar o acontecimento. Quando enfim reencontrou-se na exatidão do caminho certo – aquele que o levaria à sua fada encantada –, ainda pôde abraçá-la com toda a força que guardava dentro de si, chegando a arrebentar-lhe as asas. Era tarde, porém, pois que sua amada já se havia transportado para outras dimensões que ele ainda não estava – e talvez jamais estaria – autorizado a conhecer.

Em seu lugar, ficaram apenas os casulos que ela protegia em meio aos cabelos e as borboletas que fugiram no seu último suspiro.

Somente agora o homem compreendia: a fada que amara – e que ainda amava – e que talvez para todo o sempre amaria – deixou-lhe borboletas como forma de conforto.

Desde então, o homem passou a sempre acenar para as borboletas que via. Tinha certeza de que era sua amada que vinha visitá-lo, para enfeitar-lhe a vida com cuidados de todas as cores aladas que podiam existir.